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LISBOA
Pedro Passos Coelho afirmou durante a campanha eleitoral que tem uma ligação pessoal a África que lhe confere uma sensibilidade especial para os problemas dessas comunidades. Ontem reafirmou que a Lusofonia é uma prioridade. Será que o líder do PSD e futuro primeiro-ministro é um português africano ou, apenas, um português europeu?
Na campanha, Pedro Passos Coelho, considerou que é "o mais africano de todos os candidatos ao Parlamento", pela sua ligação pessoal a África, por ter uma mulher da Guiné-Bissau e uma filha que "também é africana" e, talvez, por ter bebido água do Bengo (Angola). “A minha raiz pessoal está muito ligada a África, também. Praticamente posso dizer que casei com África", acrescentou o presidente do PSD. Será para acreditar? Passada a fase eleitoral em que todos os políticos portugueses tinham alguma coisa de africano, fico à espera de saber se para Passos Coelho, por exemplo, Angola vai de Cabinda ao Cunene, e se eventualmente o novo governo português vai dizer alguma coisa sobre o facto de 68% da população angolana ser afectada pela pobreza, ou de a taxa de mortalidade infantil ser a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Também vou ficar à espera de ver o sucessor de José Sócrates, seja ele António José Seguro, Francisco Assis ou outro qualquer, dizer alguma coisa sobre o facto de apenas um quarto da população angolana ter acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade. Por outro lado, como é óbvio, não fico à espera de ouvir Pinto Balsemão recordar que em Angola 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos. Ou Belmiro de Azevedo recordar que a taxa de analfabetos é bastante elevada, especialmente entre as mulheres, uma situação é agravada pelo grande número de crianças e jovens que todos os anos ficam fora do sistema de ensino. Ou António Pires de Lima (Presidente da Comissão Executiva da UNICER e dirigente do CDS/PP) dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos. Ou Jorge Coelho (Mota-Engil) dizer que, em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos. Ou Armando Vara (presidente da Camargo Corrêa para África) dizer que 80% do Produto Interno Bruto angolano é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população; que 70% das exportações angolanas de petróleo tem origem na sua colónia de Cabinda. Fico, entretanto, à espera (sentado) de ver se alguém do novo governo PSD/CDS se lembra de que, no dia 9 de Julho de 2004, o presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, Luís Filipe Menezes, defendeu a criação de um Ministério para a Lusofonia, independente do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e a "naturalização de todos aqueles que queiram ser portugueses". Igualmente sentado vou continuar para ver se alguém se preocupa em explicar aos jovens portugueses o que é a real Lusofonia. Hoje, para eles, é mais importante o que se passa em Kiev do que o que se passa em Luanda, é mais importante o que se passa em Bruxelas do que o que se passa na Cidade da Praia, é mais importante o que se passa em Tripoli do que o que se passa em Díli. E se calhar até têm razão. Portugal adoptou oficialmente a tese de que a Europa é que tem futuro (e, de facto, os credores é que mandam). E quem sou eu para justificar que o presente pode ser a Europa, mas que o futuro, esse passa pela África lusófona? Sim quem sou eu? Se, de facto, a dita CPLP é uma treta, e a Lusofonia é uma miragem de meias dúzia de sonhadores, o melhor é mesmo encerrar para sempre a ideia de que a língua (entre outras coisas) nos pode ajudar a ter uma pátria comum espalhada pelos cantos do mundo. E quando se tiver coragem (para mim será cobardia, mas quem sou eu?) para oficializar o fim do que se pensou poder ser uma comunidade lusófona, então já não custará tanto ajudar os filhos do vizinho com aquilo que deveríamos dar aos nossos próprios filhos. É claro que na lusofonia existem muitos seres humanos que continuam a ser gerados com fome, nascem com fome e morrem, pouco depois, com fome. Mas, é claro, morrem em... português... o que significa um êxito para a língua. Orlando Castro
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D. Januário Torgal Ferreira, bispo das Forças Armadas portugueses, dizia em Julho de 2010 que não entendia bem as medidas de austeridade impostas pelo Governo, avisando que poderiam ter elevados os custos sociais.
E eu a julgar que estava isolado nesta dificuldade de comprender as teses do sumo pontífice do PS, José Sócrates, agora (mui) bem acompanhado pelo líder do PSD, Pedro Passos Coelho. “É preciso ter muito cuidado. Porque é nestas horas que se fazem grandes fortunas. E, sobretudo, é nestas horas em que os mais pobres ficam mais pobres e alguns ricos ficam muitíssimo mais ricos”, disse o prelado no Funchal, à margem da comemoração dos 58 anos da Força Aérea Portuguesa. Pois é. Agora que José Sócrates poderá ter de deixar a cadeira do poder verifica-se, apesar de ele ainda lá estar sentado, que o seu mais do que provável sucessor (Pedro Passos Coelho) deverá adoptar o mesmo receituário, variando apenas a cor do papel da receita. Pela minha parte, tenho dito ao longo dos últimos anos que o governo socialista tudo tem feito para que os poucos que têm milhões passem a ter mais milhões, ao mesmo tempo que os milhões que têm pouco ou nada passem a ter ainda menos. Isso não me impede (pelo contrário) que, como é basilar no Jornalismo - não no (jorna)lismo -, aqui se continue a dizer o que se pensa ser a verdade, mesmo que isso desagrade aos futuros donos do reino, sejam eles quais forem. Para já, o ainda reino lusitano e socialista regista 700 mil desempregados, 20% da população a viver na miséria e mais 20% a viver na pobreza. Ver-se-á o que vai acontecer se o governo mudar. Mas, a fazer fé no que se vai conhecendo, estes números vão continuar a subir. “Nós temos de lutar e dizer em voz alta, com respeito, respeitando a liberdade, respeitando as pessoas, mas respeitando antes de mais a verdade”, apontou D. Januário Torgal Ferreira. Porque D. Januário Torgal Ferreira teve o que no seu tempo não era raro, mas que hoje é raríssimo, privilégio de nascer com coluna vertebral, certamente que daqui a alguns meses o vamos ver a repetir estas afirmações. É claro que ao bispo das Forças Armadas foi mais fácil dizer estas verdades. Desde logo porque, ao que julgo, o ministro da Defesa, Augusto Santos Silva, não o despediu ou – como fez o governo noutras situações – deu cobertura a despedimentos colectivos nas Forças Armadas. Eu sei que caberia aos jornalistas (ainda há por aí alguns que teimam em dar voz a quem a não tem) estar na primeira linha dos que, “com respeito, respeitando a liberdade, respeitando as pessoas”, devem sobretudo “respeitar antes de mais a verdade”. No entanto, por experiência própria, os jornalistas sabem que, neste reino socialista lusitano, dizer a verdade é mais de meio caminho andado para o desemprego. E tanto sabem disso que, hoje, estão a dar a volta e a trocar as amizades do Largo do Rato pelas da Rua de São Caetano. Orlando Castro José Eduardo dos Santos, presidente não eleito de Angola há 31 anos, felicitou Aníbal Cavaco Silva pela sua reeleição para a Presidência da República portuguesa, considerando que esta vai contribuir para aprofundar as relações entre Luanda e Lisboa. Vai com certeza.
Na mensagem enviada a Cavaco Silva, Eduardo dos Santos deseja que o Presidente reeleito «alcance maiores êxitos neste seu segundo mandato à frente da chefia do Estado português». José Eduardo dos Santos disse ainda ao seu homólogo português que a sua vitória eleitoral «há de contribuir para o aprofundamento dos laços de amizade e cooperação entre os dois povos». Entre os dois povos não diria. Mas certamente que contribuirá para reforçar os laços entre os poucos que, tanto em Portugal como em Angola, têm milhões. Recorde-se, por exemplo, que em Março de 2009, no Palácio de Belém, só dois jornalistas de cada país tiveram direito a colocar perguntas a Cavaco Silva e a Eduardo dos Santos. Um deles, certamente no cumprimento da sua profissão mas, é claro, à revelia das regras dos donos dos jornalistas e dos donos dos donos dos jornalistas, questionou Cavaco Silva sobre esse eufemismo a que se chama democracia em Angola, e perguntou a Eduardo dos Santos quando haveria eleições presidenciais no seu país. Cavaco Silva limitou-se a... não responder e Eduardo dos Santos disse que não sentia falta de legitimidade, acrescentando que um dia haveria eleições presidenciais em Angola. Quando, no dia 3 de Setembro de 2008, o mesmo Cavaco Silva falava na Polónia a propósito das eleições em Angola, disse o óbvio (uma das suas especialidades): “Desejo que as eleições ocorram com toda a paz, sem qualquer perturbação, justas e livres como costumam dizer as Nações Unidas nos processos eleitorais". Nessa altura, como sempre, Cavaco Silva nada disse sobre o facto de quatro órgãos de comunicação social portuguesa - SIC, Expresso, Público e Visão – terem sido impedidos de entrar em Angola para cobrir as eleições que foram tudo menos justas e livres. Afinal, hoje, Cavaco Silva, embora mais comedido, continua a pensar da mesma forma que José Sócrates, para quem Angola nunca esteve tão bem, mesmo tendo 68% dos angolanos na miséria. De facto, como há já alguns anos dizia o Rafael Marques, os portugueses só estão mal informados porque querem, ou porque têm interesses eventualmente legítimos mas pouco ortodoxos e muito menos humanitários. Custa a crer, mas é verdade que os políticos, os empresários e os (supostos) jornalistas portugueses (há, é claro, excepções) fazem um esforço tremendo (se calhar bem remunerado) para procurar legitimar o que se passa de mais errado com as autoridades angolanas, as tais que estão no poder desde 1975. Alguém, pergunto eu, ouviu Cavaco Silva recordar que 68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Não, ninguém pergunta até porque ele não responde. Alguém o ouviu recordar que apenas 38% da população tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico? Alguém o ouviu recordar que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade? Alguém o ouviu recordar que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos? Alguém o ouviu recordar que a taxa de analfabetos é bastante elevada, especialmente entre as mulheres, uma situação é agravada pelo grande número de crianças e jovens que todos os anos ficam fora do sistema de ensino? Alguém alguma vez o ouvirá dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Alguém alguma vez o ouvirá dizer que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos? Alguém alguma vez o ouvirá dizer que 80% do Produto Interno Bruto angolano é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população; que 70% das exportações angolanas de petróleo tem origem na sua colónia de Cabinda? Alguém alguma vez o ouvirá dizer que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder? Não. O silêncio (ou cobardia) são de ouro para todos aqueles que existem para se servir e não para servir. Orlando Castro |